Sou uma ex-motorista. Não, não é bem isso. Não sou "ex" como se é ex-mulher, ex-presidente, ex-madrinha da bateria. Na verdade, nunca ocupei o cargo. Tirei a carteira, dei umas voltinhas, suei frio na Ipiranga uma meia dúzia de vezes e desisti. Tirei meu calhambeque da chuva. Não é pra mim. Tchau. Fui.
Dizendo assim, "e desisti", parece que foi fácil. Não foi. Admitir o fracasso, resignar-se a ele, foi uma pedreira existencial. É duro dar marcha a ré em uma decisão. Custou noites e noites de sono e um fio de cabelo branco que eu batizei de "primeira marcha". Amigos e parentes motoristas, generosamente, fizeram preleções de todos os tipos para me convencer a continuar tentando. O tipo motivador: "Vai em frente, guria. Isso é moleza pra ti". O tipo exemplar: "Eu era bem assim no início". O tipo solidário: "Eu dou umas voltinhas contigo". O tipo autoritário: "Nem se atreva a desistir agora, sua biltre".
Diante do fato consumado, porém, fez-se um inesperado silêncio. O pior tipo de silêncio: o de piedade. Como se estivesse claro que eu tinha uma disfunção motora grave, um bloqueio psicológico oculto, uma fraqueza de vontade vexatória. Olhavam e inclinavam a cabeça pro ladinho. Alguns suspiravam. Mas mesmo me sentindo da altura de um pára-choque de Fuca, segurei o tranco. Quem disse que eu não tenho força de vontade? Cheguei ao inacreditável paradoxo de me orgulhar da minha coragem para abraçar o fracasso. Inventei o fracasso triunfante.
É verdade que eu não levo muito jeito pra coisa - fazer o quê? Até para regar canteiro é preciso técnica e uma certa manha. Mas o que definiu realmente a partida não foi (apenas) a minha falta de talento. O que mais me incomodou foi o climão geral do negócio, a "vibe" - as manobras desnecessariamente arriscadas, a impaciência, a violência implícita no processo todo. Cheguei à conclusão de que eu queria incluir isso na minha vida tanto quanto eu gostaria de acompanhar a próxima temporada do campeonato mundial de boxe. Não, obrigada, fica para a próxima encarnação.
Será que estou exagerando? Será que isso é só desculpa para justificar o meu fracasso triunfante? Pode ser. Mas a excelente reportagem sobre violência no trânsito me deu alguns bons argumentos. A jovem finlandesa que percorreu algumas das zonas mais congestionadas da Capital e se chocou com a selvageria do trânsito gaúcho disse tudo: "Eu não conseguiria dirigir aqui". Viram? Bingo! A solução pra mim é mudar para a Finlândia. Ou continuar filando carona.
Claudia Laitano - que assim como eu detesta dirigir!
2 comentários:
Mimimi-mimimi. Mimimi mimimi: mimimi, mimimi! Mimimi? Mimimi...
Tá errado. É pipipi-pipipi-pipipi!
Pipipi-pipipi?
pipipiiiii!
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