Não posso deixar de falar do assunto.
Quando mais elogio, mais sou incompreendido.
Eu amo a estética do lixo.
E adoro a verdade.
Chamo lixo de lixo, chinelagem de chinelagem, baixaria de baixaria.
Gosto de me “acanalhar”.
Frequento funk disfarçado de deputado federal.
Lixo para mim é arte suprema.
A democracia fez um bem danado para a nossa criatividade.
A
cada ano estamos melhores e mais famosos no mundo.
Na ditadura, eram aqueles chatos com suas entrelinhas, Chico Buarque e outros trancados no armário.
Depois do fim do regime militar, livres das censura, floresceram nossos gênios.
Michel Teló é o ápice dessa evolução.
Alguns dos primeiros sinais dessa maré criativa apareceram com a boquinha da garrafa.
Foi um dos momentos mais sensuais da nossa nova era musical.
Tivemos a explosão de deusas com letras desconcertantes como aquela, maravilhosa, vai rolar a festa.
A tempestade criativa continuou: bombamos com a genial rebolation, uma mistura de modernismo com pós-modernismo, de Joyce com Guimarães Rosa, de concretismo com sacanagem.
Do carvalho!
E teve também o novo lobo mau, diz aí menina onde você vai.
E o refrão, que refrão, pós-tudo: vou te comer, vou te comer, vou ter comer.
Tropicalista, baianista, antropofágico, pirotécnico.
Toda ano, uma nova obra-prima,
A arte do escatológico levada ao extremo.
Aí chegou o Teló e matou a pau.
Nunca fomos tão longe.
Tudo pelo hedonismo, pelo prazer, pelo acasalamento.
Coisas que intelectuais tapados não compreendem.
Teló representa o pós-humano, o pós-orgânico, o homem ciborgue, o homem finalmente liberado de uma parte do seu corpo, parte inútil, parte chata, parte criadora de problemas, dispensável, o cérebro.
Eu sempre fui contra a ditadura militar, aqueles generais broncos, um sem pescoço, todos carne de pescoço, mandando torturar, matar, prender, arrebentar, censurar e ainda ganhando nome de rua.
Pelo jeito, se quiseremos ter novos Chico e Caetano, teremos de pedir a voltar dos coturnos.
Sem repressão, o pessoal não se inspira.
Fica só na aspiração.
No tempo dos milicos a imaginação popular tinha os seus ícones, de Sidnei Magal a Valdick Soriano.
O duplo sentido, essa arte milenar do bom gosto popular, cantava coisas como onde a vaca vai, o boi vai atrás.
Não tínhamos a Florentina nem a eguinha pocotó.
Ou já tínhamos?
Ou tudo isso já estava no Decamerão e em Gargantua e Pantagruel?
Sei lá.
Sei que agora estamos no auge, na liberdade absoluta, no apogeu.
Michel Teló é o novo Glauber Rocha, o tropicalismo inteiro num homem só.
Meu ídolo.
Barroco, barraco, chacrinesco.
Nada de ditadura.
Salvo, quem sabe, para nos salvar dos humoristas atuais.
Só a ditadura poderia nos livrar do CQC.
Só no pau-de-arara Danilo Gentilli pararia de defecar pela boca.
Quanto ao resto, tudo tem meu apoio.
Especialmente aquela obra-prima, aquele refrão, aquela pérola,
Ai se eu te pego!
Complemento à sacada genial, poética, burilada, dar uma fugidinha com você.
Que tempos!
Que mal tem?
Nenhum.
Só os intelectuais não compreendem.
Não pegam ninguém.
Teló é a cara do Brasil, desse Brasil que dá certo, que brilha lá fora, que ama a vida, que goza e reverbera.
Chegamos no alto. Por baixo.
Ano que vem tem mais.
Como dizia Guy Debord, o que é bom aparece.
E o que aparece é bom.
O resto podem ser muito bom.
O muito bom é ruim.
Choro de perdedor.
E viva Michel Teló.
E pau-de-arara para o pessoal do CQC.
Do mestre Juremir Machado da Silva
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